terça-feira, 30 de dezembro de 2014

Teresa Colomer: "Literatura não é luxo. É a base para a construção de si mesmo" II

Teresa Colomer: "Literatura não é luxo. É a base para a construção de si mesmo"

Coordenadora do Grupo de Pesquisa de Literatura Infantil e Juvenil e de Educação Literária (Gretel), da Universidade Autônoma de Barcelona, fala sobre o ensino de literatura na escola

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Como organizar o ensino da literatura?
TERESA Criando tempos e espaços distintos para que os alunos desfrutem de vários tipos de leitura, de acordo com os objetivos escolares, que são variados. Ensinar hábitos de leitura, por exemplo, é diferente de ensinar aos estudantes conceitos literários que permitirão a eles gozar mais das leituras que fazem.

A leitura autônoma deve ser foco das aulas?
TERESA Sim, é imprescindível que as crianças leiam de forma independente na escola porque nem todas vão fazer isso quando estiverem fora dela. O papel da Educação em relação a essa desigualdade social é muito importante. Para aprender a ler de forma rápida e eficiente, é necessária muita dedicação. Os alunos só conseguem isso com o investimento dos educadores, que precisam ensinar também como escolher o que ler.

Em um estudo do Gretel, os pesquisadores identificaram a categoria leitor mediano, que está entre o competente e o não leitor. Como a escola deve trabalhar com as pessoas desse perfil?
TERESA Estudantes assim classificados têm algum hábito de leitura e leem entre cinco e dez livros por ano. Eles precisam, contudo, alcançar leituras mais elaboradas e diversificadas. São fáceis de ser conquistados, mas podem se tornar leitores fracos se não tratarmos bem deles. O que geralmente ocorre, principalmente nos anos finais do Ensino Fundamental, é que eles acabam se viciando em determinados gêneros e acabarem virando colecionadores. Quando as possibilidades de leitura se esgotam, não sabem o que fazer, desconhecem outras opções. Precisamos, então, observar de que tipo de obra gostam e ampliar o universo leitor deles, relacionando os títulos que já leem a outros, mais desafiadores e mais elaborados, porém, que preservam alguma semelhança com o que já é apreciado. Lembremos de que são leitores medianos, podem se sentir desestimulados diante de uma leitura complexa, por exemplo.

Como o professor pode melhorar a própria formação literária?
TERESA Esse é um problema sério. Pesquisas sobre o que os alunos de Pedagogia e das licenciaturas leram ou leem indicam que essa formação deixa a desejar. Se o educador não conhece os livros não pode formar leitores. Há várias formas de entrar nesse universo: frequentar bibliotecas, trocar indicações com colegas e participar de clubes de leitores nas redes sociais, por exemplo.

O que acha do uso de livros adaptados e resumidos na escola, baseado no argumento de que os estudantes não conseguiriam entender os originais? 
TERESA Não tenho uma opinião contundente. É uma questão complexa. Primeiramente, porque ainda não se fez um debate profundo sobre a qualidade da infinidade de material que está sendo produzido em suportes digitais. Em segundo lugar, porque temos de considerar que há boas adaptações, como a história de Dom Quixote, do espanhol Miguel de Cervantes (1547-1616)assinada por Monteiro Lobato (1882-1948) (Dom Quixote das Crianças, 152 págs., Ed. Globo Livros, tel. 11/3767-7514, 32 reais). Por fim, porque podemos até não sugerir a leitura de adaptações e resumos, mas as pessoas vão acabar em contato com eles de alguma maneira. Nesse momento, acredito que a indicação de leitura e o uso em sala de aula depende do livro. Uns respeitam o argumento do original, por exemplo. Especificamente com esses, os alunos podem aprender, mas não terão contato com a linguagem usada pelo autor, pois o texto foi simplificado. Isso é melhor do que não ler nada? Creio que sim.

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